Toda vez que alguém me pergunta qual é a minha sobremesa favorita, eu tenho um pouco de dificuldade de responder. São tantas as coisas que eu gosto, que eu acabo me perdendo e fugindo da pergunta. No entanto, embora eu não tenha uma sobremesa favorita, eu tenho um doce favorito. Ele não é bem um doce, é mais um croissant misturado com caramelo crocante. O nome dele é Kouign Amann (pronuncia-se cuin amãn).
A primeira vez que eu ouvi falar desse doce eu ainda estava em Paris, durante o curso básico de confeitaria. Foi bem engraçado, porque a aula em que a gente aprendeu a fazer esse doce era a mesma aula em que a gente aprendeu a fazer croissant. E claro que eu estava muito mais interessada em aprender a fazer croissant do que em fazer um doce que eu nunca tinha ouvido falar antes na vida.
Eu me lembro muito bem que o cheiro vindo do forno enquanto o chef estava assando os benditos era simplesmente maravilhoso: uma mistura de caramelo com manteiga e pão fresco. Mas me lembro de não ter dado muita bola pra ele… até o momento em que eu experimentei um pedaço no final da aula. Era simplesmente inacreditável. Aparentemente kouign amann era a especialidade do chef que estava dando a aula naquele dia, e o resultado final era um croissant mais amanteigado (como se isso fosse possível!) com uma crosta caramelada e crocante no fundo e um saborzinho salgado bem de leve no final. Pra mim era impossível alguma coisa tão simples ser tão gostosa.
Desde então eu passei a experimentar todos os kouign amanns que eu venho a encontrar por aí, o que não é uma tarefa tão simples assim. Nos EUA já experimentei em vários lugares (Dominique Ansel em NYC, algumas padarias locais em San Francisco, alguns perdidos em supermercados como o Trader Joe’s e Whole Foods) e em algumas confeitarias francesas aqui em Toronto e em Montreal (inclusive em Montreal tem uma confeitaria que só vende kouign amann!). Mas nada, absolutamente nada chega perto de nenhum kouign amann que eu comi na França.
Fui olhando algumas receitas em vários livros aqui em casa, e em alguns sites online (como o 750g, em francês e o David Lebovitz) e no final das contas cheguei em uma receita que se parece muito com os kouign amanns de Paris.
A grande diferença, devo dizer, não é tanto na técnica em sí mas sim com os ingredientes que você vai usar — especialmente a manteiga e a farinha. Pra essa receita aqui eu usei farinha italiana tipo 00 (mais ou menos parecida com a farinha T45 que é vendida na França) e manteiga com sal francesa genérica comprada no Trader Joe’s, e devo dizer que foi o melhor resultado que eu já tive desde que voltei pro Canadá.
Mas no final das contas, dá pra fazer com farinha e manteiga normal? Lógico que dá. O gosto fica o mesmo? Não, mas vai ficar delicioso do mesmo jeito.
Quem me conhece, sabe o perrengue (e o preço!) que é de encontrar manteiga francesa aqui no Canadá. No Brasil é bem mais fácil de achar manteiga Président ou Paysan Breton, apesar de não ser a coisa mais barata do mundo. Eu pessoalmente sou a louca das manteigas e sinto diferença quando uso uma marca ou outra, mas se joga com o que você tiver aí que vai funcionar tranquilo.
O processo pra fazer kouign amann é bem parecido com o processo pra fazer croissant. A massa é feita com fermento biológico e precisa crescer antes de receber a manteiga pra fazer a folhagem. A ultima folhagem é feita com açúcar ao invés de farinha (por isso o caramelo!) e os doces precisam crescer por cerca de meia hora antes de ir ao forno.
Dica: faça essa receita quando o dia estiver bem friozinho (bem conveniente nessa época do ano!), pra não ter problema com a manteiga derretendo durante o processo de folhagem. Pra massa crescer, deixe dentro do forno ou do microondas (desligados, claro!) ou em algum outro lugar mais quentinho que você tenha em casa.
Não é a receita mais rápida do mundo, mas eu garanto pra você que dificilmente alguma coisa tão simples vai ser tão gostosa como essa! Se fizer, posta lá no Instagram e me marca! Quero ver o resultado de vocês!
- 12 g de fermento ativo seco
- 275 g de farinha de trigo
- 175 ml de água morna
- 7 g de sal
- 10 g de manteiga com sal, derretida
- 225 g de açúcar
- 225 g de manteiga com sal, fria, cortada em cubos
- No bowl da batedeira (se for usar a batedeira) ou em uma tigela (se quiser fazer a massa manualmente -- também funciona!) coloque a água morna e o fermento seco para dissolver e deixe repousando por 10 minutos. Adicione a farinha, o sal, a manteiga derretida e o açúcar no bowl e bata com o gancho da batedeira (ou sove com as mãos) até que a massa fique lisa e uniforme.
- Transfira para uma tigela limpa, cubra com filme plástico e deixe crescer até dobrar de volume.
- Enquanto isso, entre duas folhas de papel manteiga e com a ajuda de um rolo de macarrão, espalhe a manteiga cortada em cubos e bata com o rolo de macarrão até formar um quadrado grande e uniforme de manteiga. A idéia aqui é ter um quadrado de manteiga com mais ou menos 15x15 cm e cerca de 1,5 cm de altura.
- Quando a massa tiver crescido, remova-a da tigela e coloque-a em uma superfície limpa e enfarinhada.
- Abra a massa em um quadrado maior que o seu quadrado de manteiga (algo como 25x25 cm funciona bem) e coloque a manteiga no centro.
- Cubra o quadrado de manteiga com a massa, como se você estivesse envelopando a manteiga com a massa. Tome cuidado pra não deixar nenhuma manteiga escapar pra fora nesse processo.
- Rapidamente vá abrindo esse quadrado de massa com a manteiga dentro até que ele vire um retângulo de 45x15 cm (ou seja, você vai abrir a massa só na vertical!), e dobre a massa em três terços, como se fosse uma carta.
- Cubra a massa com papel filme e deixe na geladeira por 30 minutos.
- Ainda em uma superfície enfarinhada, coloque a massa com a parte "aberta" virada para você, e abra de novo um retângulo de 45x15 cm. Dobre novamente em terços e coloque na geladeira por mais 30 minutos.
- Dessa vez, polvilhe açúcar generosamente na superfície de trabalho e abra a massa em um retângulo da mesma forma que no ultimo passo. Polvilhe açúcar dessa vez por cima da massa (assim você vai ter açúcar em toda a massa) e dobre em terços pela ultima vez. Retorne à geladeira por 30 minutos pela ultima vez.
- Polvilhe mais açúcar na superfície de trabalho e dessa vez abra a massa normalmente em ambos os sentidos (vertical e horizontalmente), até que você tenha um retângulo de aproximadamente 45x25 cm.
- Com uma faca bem afiada ou com um cortador de pizza, corte quadrados de massa e aperte cada um dos cantinhos no centro da massa, formando um quadrado arredondado nas pontas. Você também pode cortar retângulos e enrolar a massa em espiral, como se fosse um cinammon roll.
- Coloque cada um dos quadradinhos em uma forma para muffins e deixe a massa crescer por cerca de 30 minutos ou até que ela preencha cada uma das cavidades da forma de muffins até o topo.
- Se preferir, coloque as espirais em uma forma de fundo falso de 20 cm untada com manteiga e açúcar no lugar da farinha, e acomode-as de forma a preencher toda a forma. Também deixe crescer a massa por 30 minutos nesse caso.
- Leve ao forno pré-aquecido a 185°C por 35-40 minutos ou até que a massa esteja assada por fora e caramelizada por baixo.
- Retire das formas (tanto de muffin ou a de fundo falso) enquanto estiver ainda quente -- se você deixar esfriar, o caramelo vai grudar na forma e você não vai conseguir tirar nem com reza braba 🙂